...salta! salta! salta!...
Há aquela música que é em tudo, evitável de ser escutada. Ainda mais se escutada por alguém que se prepara para saltar do 32º andar, para cair prostrado no betão agreste e desprovido de sentimentos.
Nesta minha mais recente meditação calculada e merecedora de pausa para discernimento, resolvi ponderar a melodia que não faz mesmo falta nenhuma na vida de alguém que, malograda e pateticamente, escolhe uma música caguinchas como balada para o momento final.
E, meus fiéis já meritórios de um esfregão na moleirinha com os nódulos dos dedos, apresento-vos o projecto que tantos dias levou a ver a luz do dia.
Dou-vos a rubrica:
MÚSICA QUE, SE NÃO TIVESSE SIDO PARIDA POR ALGUÉM, TERIA DE SER INVENTADA!
...(palmas, assobios frenéticos, delírio, roupa interior a ser lançada para o púlpito)...
Sinceramente, já era altura de haver alguém destemido o suficiente para dedicar tempo a criar um espaço que, genialmente, sirva dois propósitos.
Alguém está próximo de um parapeito a tomar balanço para mergulhar. Esse alguém pede-vos para cantar uma modinha. Se tentassem evitar que esse alguém se atirasse de uma altura considerável, em direcção a uma morte certa, qual a música que NÃO deveriam cantar?
Para vosso deleite e regozijo, apresento-vos desde já e sem paninhos quentes, senhoras e senhores, na rubrica MÚSICA QUE, SE NÃO TIVESSE SIDO PARIDA POR ALGUÉM, TERIA DE SER INVENTADA!, a eleita das eleitas, a matriarca das matriarcas, o busílis do génesis: "PAPEL PRINCIPAL" interpretada por Adelaide Ferreira!
...(multidão ébria, unida em celebração histérica)...
Conseguem ouvi-la crescer na vossa mente? Como se tivessem ouvido aquela do "eu vou comer laranjas e bananas" que toca sem parar na vossa cabeça depois de, infelizmente, se terem cruzado com ela uma vez?...(fazem letras e músicas deste género, depois admiram-se que as crianças cresçam com problemas de compreensão e desenvolvimento mental)...
Adiante, não iriam concerteza abrilhantar o local onde está uma pessoas a tomar fôlego para se suicidar, com esta música.
Segundo um breve estudo que efectuei in loco (agradeço desde já aos suicidas, voluntários e involuntários), há dois sítios concorridos que os suicidas muito estimam para encerrar o seu ciclo. Das duas, uma.
Parapeito do terraço revestido a alcatrão de um prédio, ou uma clássica e imponente ponte em ferro.
Seria pior a emenda que o soneto, cantar algo não premeditado e estruturado por um estudo prévio.
Para isso, deixo-vos com um bom exemplo de quando se age sem pensar e do que não se deve fazer:
- Pára! Escuta, deixa-me ajudar-te!
- (gane e chora histericamente como uma menina colegial) Ajudar-me para quê!? Este mundo está perdido! (funga) Já nada me sustem aqui (sons indecifráveis feitos com o nariz), nada me satisfaz!...
- Tem de haver uma maneira. Pensa.
- (chora, chora) Uma modinha? Dava-me jeito algo que me distraísse e tranquilizasse. (suspiro) Que me afastasse desta ideia de suicídio.
- Bem, eu...assim de repente...posso sempre tentar...(inspira fundo)...abram alas para o Noddy (NODDY!) com o seu carro amarelo. Abram alas para o Noddy (NODDY!) o dia vai ser tão belo...